Portal de Eventos Científicos em Música, 3º Congresso Brasileiro de Iconografia Musical

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As imagens do músico caipira: ideias topificadas e tropificadas na consubstanciação de uma referência cultural paulista
Diósnio Machado Neto

Última alteração: 2015-10-24

Resumo


O contraponto entre o processo civilizador e o padrão cultural do povo brasileiro foi foco de tensão entre muitos autores, que percorriam o ideário de definir o homem brasileiro, a partir da segunda metade do século XIX. Já no último quartel dos novecentos, a análise da “impossibilidade civilizacional”, do “atraso fruto da raça”, era tônica para a reunião de especialistas de diversas áreas, da história a filósofos positivistas, que tratavam de justificar o liberalismo inclusive pelo cientificismo spenceriano. Em São Paulo, esse movimento ganhou mais força com o desenvolvimento da economia cafeeira. No momento que uma nova elite se formava, calçada numa reconfiguração complexa do quadro de poder, surgia um alinhamento com um republicanismo por um modelo de estados federativos, ou seja, que reivindicava uma forte autonomia política. Esse processo impulsionou a formação de um capital simbólico que elegia emblemas por um cunho de sentimento desbravador. O símbolo de todo esse processo foi o Bandeirante, e nesta esteira, o homem sertanejo. Foi assim, no bojo do bandeirantismo, que o caipira foi ganhando espaço no imaginário paulista, tornando-se figura central de uma picardia regional, nem sempre positiva, mas certamente representativa de uma parte da identidade paulista. Pelo caipira se conjugava os contrários, desde a crítica a indolência do homem rural, à sabedoria ingênua que se adaptava às agruras da terra. Enfim, era um símbolo das próprias contradições de São Paulo: uma cultura que crescia no desejo do desenvolvimento urbano sustentado pela força da economia agrária. Há que se dizer que estes conflitos internos tornaram-se mote arte nacional, em autores como Afonso Arinos, ou mesmo Machado de Assis, que abordava o conflito em contos como “O Machete” e “Um Homem Célebre”. Em São Paulo, Monteiro Lobato foi um dos principais debatedores, forjando sobre a figura de Jeca Tatú todo um acervo de cultura regionalista. Porém, Lobato já seria uma segunda geração de artistas que dramatizavam o discurso da picardia local.
Na ponta de lança estava, entre outros, o pintor Almeida Júnior (1850-1899). O objetivo desta comunicação é mostrar, primeiro, a tensão entre o rural e o urbano por três telas de Almeida Júnior: Descanso de Modelo (1870); Cena de família de Adolpho Augusto Pinto (1891); e O Violeiro (1899). Principalmente por esta última analisaremos a projeção da ideia do caipira extraindo da imagem de Almeida Júnior formações e projeções retóricas que se cristalizaram na definição do imaginário do homem rural paulista. Será um dos objetivos observar como a ideia do caipira retratado por Almeida Júnior se cristalizou em diversas obras de arte, desde as de forte impacto iconográfico, como Mazzaropi e Chico Bento, até a sua projeção no musical, dos ponteios de Camargo Guarnieri e da MPB de Edú Lobo à atual caracterização da música sertaneja comercial. Este estudo forma parte de um projeto de pesquisa que trabalha sobre a formação discursiva do homem caipira, desenvolvido dentro do Laboratório de Musicologia de Ribeirão Preto.

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