Portal de Eventos Científicos em Música, 6º Congresso Brasileiro de Iconografia Musical

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O exótico Brasil no imaginário da Casa Lucca
Lucas D'Alessandro Ribeiro, Marcos da Cunha Lopes Virmond

Última alteração: 2021-07-02

Resumo


Editora musical na Milão do século XIX, a Casa Lucca foi o maior rival da Casa Ricordi, ambas dominando o mercado operístico da península e estendendo sua influência por toda a Europa. A Casa Lucca surgiu em 1825 quando Francesco Lucca, que tinha sido treinado na arte da incisão musical na Casa Ricordi, funda sua própria editora. Francesco Lucca foi o responsável pela abertura dos palcos italianos aos grandes nomes da ópera europeia, como Meyerbeer, Halevy e Gounod. Participava, assim, do crescente interesse que a scapigliatura milanesa defendia, contra a vontade do establishment, de renovar sua música lírica, particularmente no que se referia às novidades do drama lírico francês. Salienta-se nessa índole inovadora e audaciosa da Casa Lucca o contrato que Giovannina Lucca, esposa de Francesco, fez com Richard Wagner, adquirindo os direitos de todas as obras do mestre alemão, em um momento que sua música era frontalmente repudiada pelos críticos e teatros da península. Com esse mesmo interesse pela renovação, a Casa Lucca se aproxima de Antonio Carlos Gomes quando este compõe Il Guarany. O enorme sucesso que colhe no Teatro alla Scala de Milão em março de 1870 faz com que a Casa lhe ofereça um contrato que contemplava basicamente muitas das dívidas remanescente de Gomes para a montagem de sua ópera, restando-lhe pequeno pagamento e os direitos de autor apenas para representações fora da Itália. Além da partitura de regência e das partes orquestrais, manuscritas ou impressas, a Casa Lucca produz, pelo menos, três edições para canto e piano, piano solo e piano à quatro mãos dessa ópera de Gomes, sendo a primeira em junho1870. Essas edições apresentavam dois diferentes frontispícios que seguiam a tendência da época de bem ilustrar e informar a temática da ópera, tentando captar o interesse do comprador. Este estudo objetiva analisar, do ponto de vista iconográfico na linha de pensamento de Panofsky (1995), a litografia usada pela Casa Lucca para ilustrar o frontispício da primeira edição de Il Guarany para canto e piano. A ilustração apresenta elementos textuais identificador do compositor, do título da ópera, das edições oferecidas e indicativos da casa editora e preço. Foco de análise central é a conjunto da ilustração central do frontispício que apresenta elementos indicativos o exotismo do tema central da ópera, caracterizado por vegetação tropical luxuriante e o contraponto da civilização europeia na apresentação, em segundo plano de um castelo de corte europeu. Ao centro, mas separados, estão o índio Pery e a portuguesa Ceci. Fecha essa composição, em seu primeiro plano, condensando de forma simbólica um processo de desterritorialização/reterritorialização (DELEUZE, GUATARI, 1972) ambivalente, um alaúde cruzado sobre um arco e flecha. Conclui-se que a litografia propõe uma visão romântica da relação colonizadora europeia, ainda que pretenda, mais que por sua vertente política, resumir o enredo, atrair o comprador pela beleza plástica da cena, ao mesmo tempo em que demonstra, aos olhos atuais, a visão arquetípica do europeu do século XIX de como seria o exótico e selvagem mundo tropical além do atlântico.

 

Palavras-chave: Il Guarany. Ópera. Iconografia. Colonialismo.

 

REFERÊNCIAS:

Deleuze, Gilles; Guattari, Felix. s/d. [ed. original: 1972] O Anti-Édipo: capitalismo e esquizofrenia. Lisboa: Assírio & Alvim.

Panofsky, Erwin. Estudos de Iconologia. Lisboa: Editorial Estampa, 1995.


 


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